quinta-feira, 7 de outubro de 2010

Crónica - A Insígnia

"JOANA!" - ecoou a voz dele, como se quisesse cravar o nome dela nas paredes húmidas e bolorentas - "Responda só ao que lhe perguntei!"
Ela contorcia-se na cadeira, cruzava e descruzava as pernas, torcia e contorcia os dedos sobre o colo, sobre a saia azul escura de pregas...Sempre tinha odiado aquela farda, camisa branca, imaculadamente engomada, meias puxadas até ao cimo da canela, lacinho de cetim ao pescoço... Sempre tinha odiado fardas. Facto que mudaria três anos mais tarde quando se enamoraria de um soldado da Infantaria. Mas isso ela ainda não sabia.

Agora, estava ali, perante aquele homem austero e resoluto, com o dobro do seu tamanho, olhos azuis penetrantes como dois glaciares afiados, na lapela usava uma série de pins cujo significado ela ignorava, e vestia sempre o mesmo fato castanho no Inverno e o cinzento, no Verão. Aquela figura inspirava verdadeiro temor reverencial. As rugas que sustentavam o seu semblante pareciam estar ali desde a sua juventude. Sabia-se que era a favor do "outro" sistema e que tinha sido preso depois da Revolução. Agora, dirigia aquele colégio a pulso de ferro. Podia ter sido bonito, este homem, mas o seu espírito dizimava qualquer sinal exterior de beleza. De certa forma, lembrava-lhe o seu avô que não conhecera senão em fotografias muito antigas, de outros tempos e outras eras. "Era um homem sério!" - diziam-lhe. Para ela, nem podia ser de outra forma já que em nenhuma foto lhe vira o sorriso.
"JOANA, RESPONDA-ME!" e o tempo parecia suspenso na tensão entre as duas criaturas. Ela então, limpou à saia o suor das mãos, levantou-se e disse, por fim "Sim sr., fui eu! Eu fiz a cruz suástica na sua estátua, do pátio".


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